3 de dezembro de 2011

Fala que eu acredito ou "da mágoa nasce o forever alone"



     Sempre acreditei em tudo que me diziam. Afinal, por que mentiriam sobre um novo jogo ou episódio do desenho mais esperado da infância? Não seria uma sabotagem contra nossa amizade andar pelos caminhos tortuosos da mentira? Sim, cada vez mais percebo como fui (e sou) tolo.


     Eu era aquela criança obesa que não silencia, sempre fiz muitas perguntas sobre tudo. Até hoje se ficar minutos em um diálogo, engato a marcha e procuro saber o que meu interlocutor entende como vida, o universo e tudo mais. E tenho aprendido muito com isso. Simultaneamente carrego o fardo de verificar fontes e passos lógicos. Afinal, posso não saber se é uma inverdade, mas se for mal construído, o argumento se torna falacioso. Quando criança sabia apenas dois números de telefone: o da polícia militar e de um colega de escola. Era um dos únicos que andavam comigo durante o período letivo no ensino fundamental e eventualmente nos víamos ao longo do dia.


     Cometemos este equívoco  de considerar todo e qualquer indivíduo de idade avançada, um sábio. Infelizmente esta não é nossa realidade. Mesmo assim, cláusulas do nosso contrato social de boa convivência exige que os tratemos como senhores e senhoras, como se fosse um título nobiliárquico. Outro erro.


     Este meu amigo de escola chamava meus pais pelos nomes. Isso era uma revolução, que fiz questão de retribuir. Uma pena que seus pais não eram tão liberais assim.


     Obeso que sou, passei boa parte de minha vida comendo. Inclusive quando saía, provavelmente um dos destinos seria uma pausa para refastelar-me com alguma subespécie de fast food. Ao telefonar para meu companheiro de trilhas gastronômicas, este me surpreende dizendo que está doente, o suficiente para não sair de casa. Resolvo remarcar um compromisso para a noite. Como era um jantar próximo ao local onde eu teria ido com meu amigo, resolvo buscar uma água mineral no local e tentar reconhecer alguém, uma espécie de teste social, se me cumprimentavam por ser eu ou por acompanhar o, então, adoentado colega.


     A grande diferença entre contar uma mentira e contar uma verdade é que para a última, a natureza nos é testemunha. Os fatos ocorrem naturalmente. Quando se mente, cada lacuna precisa ser coberta. Isso exige mais trabalho. Como tenho uma memória limitada, não posso me dar o luxo de grandes invenções.



     Minha surpresa foi quando vi este meu, até então enfermo conhecido, em pé, onde provavelmente estaríamos. Como sou tolo, fui congratular a recuperação rápida do mesmo. Este, junto com outros dois, iniciaram a marcha da vergonha para qualquer direção que não fosse a minha.


     Para quem tem esta visão romântica da vida, como eu, é triste ser enganado. Afinal, se uma pessoa diz ser seu amigo, você espera o no mínimo colaborar com as atividades coletivas lúdicas, inclusive a segregação dos grupos. Que seja escolhido para jogar handebol, mesmo não sendo a melhor opção, mas para que joguem no mesmo time. Que seja convidado para comemorar uma recuperação rápida e sem sequelas das diversas indisposições da vida. Que chore e ria em conjunto. Ou seja, aprendi muito cedo a ser ímpar. E isto é a pior coisa com que se pode acostumar, a solidão.


     Quando alguém mente, como mostrado em diversos seriados, acaba por agir de forma ligeiramente diferente do comum. Como piscadelas, torcer os dedos, balançar-se na cadeira e muitas outras atitudes suspeitas sugerem. Ao perceber minha presença, levantar e sair na marcha tétrica, atestou a maldade investida no ato.


     Tenho uma péssima memória para dados comuns. Infelizmente coisas que magoam, não somente a mim, mas situações emocionalmente desastrosas que aconteceram ao meu redor, lembro-as como se tivessem ocorrido neste fim de semana.


     Depois do evento, percebi que era eu quem corria atrás destes infelizes. Eu quem gastava telefone e preocupação com suas pessoas e famílias. Decidi apenas não fazê-lo. E para minha surpresa, não me foi difícil permanecer aquele primeiro ano sem um cumprimento. Muito menos o outro ano até o primeiro diálogo após o fato. Não tenho mais interesse em falar com estes indivíduos sobre o ocorrido, apenas agradeço por mostrarem para este que vos fala que o mundo é repleto de pessoas que podemos confiar. Precisamos apenas encontrá-los. E não desistir em cada tropeço como o meu, ou contentar-se com fragmentos verdadeiros em meio ao abrolho. Contentar-se é pior que desistir.


     Isto ocorreu em idos de 2001. Como não sou deus, eu posso até perdoar, mas não esqueço. Jamé [sic].


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